quarta-feira, 21 de junho de 2017

Dois títulos recentes publicados pela Sistema Solar


Rimbaud-Verlaine
O Estranho Casal

Texto de apresentação
Os sete narradores:
Arthur Rimbaud: Meteoro. Riscou a literatura francesa como um prodígio. Entre os dezasseis e os vinte anos de idade escreveu tudo o que hoje incita à maior estupefacção. Viveu e brigou com Verlaine. Depois, quase lhe não bastou o mundo: corria através dele com «solas de vento», imparável até ao exílio de Harar. Fez uma Abissínia em prosa, com tráfico de armas e talvez de escravos. Um tumor canceroso num joelho devolveu-o a Marselha, onde morreu em 1891. Ao todo, 37 anos de idade.
Paul Verlaine: Um tempestuoso drama, fermentado com violência verbal e tiros, nasce na palavra e na inocência de algumas cartas. Tinha havido deambulações a dois – apaixonadas e complicadas com absinto: Paris, Bruxelas e Londres. O grande poeta estragava já um casamento e dispunha-se a coleccionar uma boa dose de hospitais e prisões. […]
Ernest Delahaye: O maior amigo de Rimbaud desde os tempos de colégio em Charleville […]. Pertence-lhe a primeira e malograda tentativa de publicação do poeta. […]
Mathilde Verlaine: Muitas seriam as dificuldades num casamento com Verlaine, apesar das elegias de La Bonne Chanson. Mathilde vive porém os seus tumultos como heroína de um romance negro, não poupa nenhuma sombra ao retrato de Rimbaud que sairá mais tarde de entre as páginas de Mémoires de Ma Vie (1935). […]
Mme Rimbaud: Viúva de um marido vivo, dirige a barca dos seus quatro filhos com leme de aço, pede ao catolicismo severidades, dissolve amores de mãe num amargo fel. […]
Mme Verlaine: Adiantada no casamento, consegue ter um filho. Paul habituou-se a ver três fetos que o vigiavam em grandes frascos de éter, guardados pela morbidez materna numa prateleira como testemunho de um drama em três fracassos que o precedeu. […]
Isabelle Rimbaud: De cinco filhos a mais nova […]. Virá a mostrar-se com energias de temperamento herdadas da sua mãe. […] Em 1895, com um rasgo de grande lucidez intelectual, autoriza o impuro Verlaine a prefaciar as Poésies Complètes do seu irmão. [Aníbal Fernandes]


Gaspar da Noite
de Aloysius Bertrand
Texto de apresentação
André Breton chamou-lhe – quando quis enunciar no seu Primeiro Manifesto os precursores do movimento – «surrealista no passado». […]
Baudelaire lembrou-se dele quando publicou Le Spleen de Paris e escreveu na dedicatória a Arsêne Houssaye: «Tenho uma pequena confissão a fazer-lhe. Ao folhear pela vigésima vez, pelo menos, o famoso Gaspar de la Nuit de Aloysius Bertrand […] é que tive a ideia de tentar qualquer coisa análoga e de aplicar à descrição da vida moderna, ou antes, a uma vida moderna e mais abstracta, o processo que ele aplicou à pintura da vida antiga e estranhamente grotesca.» […]
Todo o reconhecimento de Aloysius Bertrand é póstumo. E hoje pode ser-lhe colada a etiqueta de «autor de culto», que levanta sempre a suspeita de venerações alheias à verdadeira consciência crítica. Transbordou da literatura. René Magritte lembrou-se dele para um quadro que se inspira em «O Pedreiro», o segundo texto de Gaspar da Noite; e em 1908 Maurice Ravel deu a conhecer em três momentos de piano «Ondine», «Scarbô» e «A Forca» (este pertencente à série dos eliminados pelo autor na edição original). Para se compreender todo este sortilégio vale a pena ouvir de novo André Breton: — «Ele precipita-nos, desde o presente, num passado onde as nossas certezas não tardam a cair em ruínas.» [Aníbal Fernandes]

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