Miguel
Almeida nasceu em
Rãs, pequena aldeia do concelho de Sátão, distrito de Viseu, em 1970. É
licenciado em Filosofia (Variante de Filosofia da Ciência) e Mestre em
Filosofia da Natureza e do Ambiente. É autor de: Um Planeta Ameaçado: A Ciência Peranteo Colapso da Biosfera (2006); A Cirurgia do Prazer: Contos Morais
e Sexuais (2010); O Templo da Glória Literária: Versão
Poética (2010); Ser Como Tu (2011) e Chireto: Uma Semana de Histórias para Contar ao Deitar (2011). Publicou também em co-autoria Já não se fazem Homens como
antigamente (2010) e foi coordenador de Palavras Nossas: Colectânea de Novos
Poetas Portugueses (2011).
Próximos títulos: O Lugar das Coisas (Maio 2012) e Contos do Nosso Tempo
(Maio 2012), como coordenador e co-autor.
A partir do próximo dia 9 de Maio estará nas livrarias o seu mais recente livro: O Lugar das Coisas, editado pela Esfera do Caos. Fale um pouco sobre o livro.
O Lugar das Coisas é o meu sétimo livro e o terceiro de poesia, em pouco mais de um ano… Posso utilizar palavras que não são minhas para falar do meu próprio livro? (risos) É que na contracapa de O Lugar das Coisas vão aparecer palavras do escritor Luís Miguel Rocha que, a meu ver, definem na perfeição este meu novo livro. Eis as palavras do Luís Miguel Rocha: “Em O Lugar das Coisas cabemos todos, criados pela voz singular de Miguel Almeida, que nos recria até ao âmago da alma e onde, mais puros, perdemos a inocência. Um livro de poesia e de vida, de humanidade e mundanidade, que nos coloca no lugar e nos acorda dos autómatos em que nos tornamos.”
Por muito que tentasse, poderia dizer de maneira diferente, fazendo uso de outras palavras, mas penso que não iria conseguir dizer melhor. Ainda assim, em poucas palavras, eis como entendo este meu novo livro de poesia: espaço de comunicação e comunhão, O Lugar das Coisas alimenta-se da palavra do que somos, como seres vocacionados para a alegria, o amor e a felicidade. Espaço de solução e consolação, O Lugar das Coisas é como um Sol no centro da vida, numa demanda de valor e sentido para existir e ser vivida.
Por muito que tentasse, poderia dizer de maneira diferente, fazendo uso de outras palavras, mas penso que não iria conseguir dizer melhor. Ainda assim, em poucas palavras, eis como entendo este meu novo livro de poesia: espaço de comunicação e comunhão, O Lugar das Coisas alimenta-se da palavra do que somos, como seres vocacionados para a alegria, o amor e a felicidade. Espaço de solução e consolação, O Lugar das Coisas é como um Sol no centro da vida, numa demanda de valor e sentido para existir e ser vivida.
O Lugar das Coisas contém 100 poemas, agrupados em 10 capítulos, com 10 poemas cada. Cada capítulo tem um título, que procura agrupar por critérios de afinidade os 10 poemas no seu interior. Para além disso, cada capítulo é antecedido de 10 “pequenos poemas” de 3 versos, uma espécie de haikus, que de certa maneira servem para “dar o mote” para a leitura dos poemas. Já se trata quase de uma matriz que utilizo nos meus livros de poesia. Voltando aos capítulos de O Lugar das Coisas… Nesses “agrupamentos” de 10 poemas há títulos como “Origem”, “Criação”, “Ser Poeta”, “Dons & Deveres”, “Palavras & Silêncios”, “Artes & Ofícios”…Antes de apresentar este trabalho para publicação à Esfera do Caos Editores, o nome que eu tinha no ficheiro do meu computador era Ars – Ad Usum Poetae. E é disso que se fazem os poemas de O Lugar das Coisas: trata-se de assumir o ponto de vista da arte, aqui quase sempre sinónima de poesia, para falar das coisas mais simples e essenciais da vida, como sejam aquelas que envolvem o sonho e a alegria, o amor e a felicidade, agora e sempre, o desejo de transcender o real. No fundo, neste nosso mundo, dito desencantado, por fora tão deslumbrante e rico de promessas, mas tão desolado e vazio por dentro, o objectivo é o de escrever sobre os lugares onde se pode enraizar a esperança que nos permite ser e viver.
É
essencialmente um escritor de poesia e de contos. Podemos esperar num futuro
próximo um romance seu, ou é de todo impensável?
Aí está uma pergunta que já me fizeram várias vezes:
amigos, amigos que também são escritores e, sobretudo, leitores. Talvez por
isso, trata-se de uma pergunta fácil e difícil de responder. Fácil, porque a
resposta é sempre a mesma: escrevo contos e sobretudo poesia por vocação, mas
também devido aos condicionalismos pessoais e profissionais que tenho na minha
vida. Sou marido, pai e filho, e essa situação deixa-me pouco tempo para
dedicar à escrita. Para além disso, também sou professor, o que me rouba muito
do pouco tempo que tenho e gostava de dedicar à escrita. A vida é feita destes
condicionalismos e é com eles que temos que conviver…
Muitas vezes não nos damos conta disso, ou damos, mas
não lhe atribuímos a devida importância: o tempo é um recurso, é talvez dos
recursos mais valiosos que nós temos. E a verdade é que é por causa dele, da
falta dele, entenda-se, que ainda não publiquei um romance.
À parte as dificuldades intrínsecas do fazer, escrever
um romance exige uma disponibilidade mental e sobretudo de tempo, tempo que
infelizmente não tenho. É com aquilo que temos, que fazemos aquilo que fazemos
ou deixamos por fazer. Daí os contos. Daí, também, a poesia. Daí, ainda, não
ter escrito até agora um romance.
Nos contos e na poesia, escrevo e largo, e quando
depois regresso é relativamente fácil recuperar o lugar onde tive que largar o
trabalho. Já num romance… Largar, ter que largar um trabalho que está começado,
é muito complicado.
Também disse acima que se tratava de uma questão
difícil de responder… É que eu gostaria de dar uma resposta diferente, até
porque sinto que quem me pergunta por um romance já está à espera dele. Mas a
verdade é que não tenho tempo para escrever um romance. Talvez um romancezinho…
(risos)
Agora a sério. Tenho alguns projectos de romance
iniciados, alguns até já numa fase bastante adiantada, com vários capítulos
escritos e até com indicações claras daquilo que há para fazer naquilo que ainda
falta escrever. Mas o tempo, entenda-se, a falta dele…
Daí a dificuldade para responder à questão… É que é difícil
conviver com a frustração, porque é disso mesmo que se trata, de ter algo para
fazer que não se consegue realmente fazer. É um pouco como conviver com aquela
situação ingrata que Friedrich Nietzsche atribui ao filósofo: uma espécie de
burro, que nem se consegue aliviar da carga que transporta nem a consegue levar
até ao destino. Por questões de formação e também de profissão, estou ligado à filosofia,
mas neste particular tenho sabido pôr de lado a carga que não tenho conseguido
carregar, felizmente para mim, felizmente, também, para as outras vertentes da
minha escrita, como os contos e sobretudo a poesia.
Que papel ou
peso tem a poesia na sua vida?
A poesia na minha vida é sobretudo um modo
privilegiado de expressão. Os Clã têm uma música que se chama “problema de
expressão”, que a Manuela Azevedo resolve com a sua forma muito peculiar de se
exprimir. (risos) Adoro os Clã, a Manuela Azevedo e esta música em particular.
Seguindo o trilho dos Clã, poderia dizer que a poesia me serve essencialmente
para resolver os meus “problemas de expressão”. Mas também serve propósitos de
interpelação e reflexão, voltadas para mim, voltadas para os outros, voltadas para
a relação (ou a falta dela) com os outros, voltadas para tudo aquilo que nos
envolve e rodeia. Nesta perspectiva, a poesia é um local de encontro, de mim
comigo próprio, de mim com os outros, de mim com a minha própria vida. A nível
estritamente pessoal, a poesia também é um espaço de realização e de conquista
constante de um (re) equilíbrio. Mas essas são outras questões…
Qual
a finalidade da poesia? É possível defini-la em uma única palavra?
A finalidade da poesia?... A poesia é uma arte, como tantas outras artes. Nesta perspectiva, a finalidade da poesia é a mesma de tudo aquilo a que genericamente chamamos “arte”: cabe-lhe interpelar a vida, numa demanda constante de sentido e significado. Numa só palavra, para mim a poesia é Vida, com tudo aquilo que essa palavra possa ser ou significar.
A finalidade da poesia?... A poesia é uma arte, como tantas outras artes. Nesta perspectiva, a finalidade da poesia é a mesma de tudo aquilo a que genericamente chamamos “arte”: cabe-lhe interpelar a vida, numa demanda constante de sentido e significado. Numa só palavra, para mim a poesia é Vida, com tudo aquilo que essa palavra possa ser ou significar.
Quais os
seus escritores de eleição?
Escritores de eleição… Poetas, muitos, quase todos,
sem distinguir sequer entre clássicos e não clássicos, entre antigos e
modernos. Na prosa de ficção, alguns, não tantos quanto os poetas… Truman
Capote, nos contos, pelo estilo, mas não só. Quanto ao resto, Somerset Maugham,
pela fluidez narrativa, mas não só. Miguel de Cervantes, por El Quijote. Mia Couto, Gabriel García
Marques, todos os que indiquei e muitos dos que não indiquei, pela inspiração
constante, mas também pela saudável inveja, misto de gratidão e admiração,
pelas obras que nos deram a ler e que gostava de ter sido eu a escrever.
A única livraria portuguesa exclusivamente dedicada à poesia fechou as portas – três anos após a sua abertura -, em Março. Como reagiu a esta notícia? Pois é… A excelente Livraria Poesia Incompleta encerrou portas… Mas encerrou “sem dívidas e sem dúvidas”. Reagi com tristeza, naturalmente. É mais um sinal dos tempos, dos maus tempos, que vivemos. Mas assim como assim, ainda restam algumas boas livrarias, espalhadas um pouco por todo o país, que representam outros tantos motivos de esperança, como são os casos da 100ª Página (Braga), da Galileu (Cascais), da A das Artes (Sines), da Leitura (Porto), da Esperança (Funchal), da Ler Devagar (Lisboa), da Pó dos Livros (Lisboa), da Poetria (Porto), da Culsete (Setúbal), da Capas Negras (Almada)...
Enquanto docente e poeta, acha que a Filosofia e a Poesia se conjugam ou são temáticas antípodas?
Para mim, a filosofia e a poesia conjugam-se e até se complementam. A prova disso mesmo é a existência das minhas obras e o testemunho maior é o conteúdo de alguns dos meus poemas. Não raras vezes, os meus poemas colocam e abordam questões que tradicionalmente são atribuídas ao núcleo duro da filosofia. Poucas vezes as resolvem, mas essa já é outra questão…
Qual o público que mais lê poesia, a seu ver?
Não há perguntas fáceis, nesta entrevista! (risos). Antes de mais, um número que me chegou por um “amigo”, da Rede Social Facebook.
No contexto de uma conversa sobre poesia, onde esse “amigo” se tentava aconselhar comigo acerca da publicação de uma obra sua de poesia, às mais das tantas surgiu o número 800, como sendo o número de leitores de poesia existentes em Portugal. Confrontado com este número, primeiro que tudo manifestei a minha estranheza, com uma expressão do tipo: “mas Portugal, diz-se por aí, até é um país de poetas!”. Numa segunda fase, tentei “sacar” informações ao meu “amigo” relativas ao número que tinha adiantado. “É o que se ouve dizer por aí”, limitou-se a dizer o meu “amigo”. E, de facto, é o que se ouve dizer por aí…
Tenho dois livros de poesia publicados, a saber, O Templo da Glória Literária – Versão Poética (2010) e Ser Como Tu (2011). Em relação a estes dois livros, tenho números relativos a vendas que me mostram que os meus livros têm encontrado os seus leitores. Para além disso, também costumo enviar os meus livros pelos correios a quem mos pede, por exemplo, através do Facebook, que também me confirmam a mesma situação. Agora, falando de números… Não estamos obviamente a falar de milhares, mas de umas centenas de leitores. Actualmente, vender 1000 ou 1500 exemplares de um livro de poesia é uma coisa fantástica. Quanto ao público – leitor… Através dos livros que envio pelos correios, tenho confirmado uma coisa curiosa. A maior parte dos leitores dos meus livros de poesia são poetas, ou escritores com grande vontade de ser poetas.
Pode partilhar connosco o livro que está lendo?
Pode até parecer estranho, mas tenho que admitir que hoje em dia leio pouco, muito pouco. No entanto, acrescento de imediato que achamos sempre ser pouco aquilo que fazemos, quando se trata de algo de que realmente gostamos. Eu gosto de ler, e gostaria de ler mais, muito mais que aquilo que leio.
Como disse, hoje em dia leio pouco, sobretudo por falta de tempo. Mais, aquilo que leio obedece a um pragmatismo muito próprio, dado que é quase sempre motivado pela minha vida profissional e literária. Sou professor de filosofia e procuro manter-me sempre a par das novidades que vão saindo nesta área. Também sou escritor, e neste caso leio por motivo de busca de inspiração, mas também de confrontação da minha escrita com o trabalho de outros escritores.
Um exemplo. Como foi dito acima, em Maio vai aparecer nas livrarias O Lugar das Coisas, o meu sétimo livro e o terceiro de poesia. Mas nesse mesmo mês vai aparecer também Contos do Nosso Tempo, uma “obra colectiva”, de que sou coordenador e co-autor. Por causa deste projecto, li várias antologias de contos e aproveitei também para reler um enorme volume dos Contos Completos, do Gabriel García Marques. Em suma, li para aprender a desempenhar o meu papel de coordenador, mas também para me entreter como leitor e inspirar como autor.
Para além deste pragmatismo todo, as minhas leituras também envolvem os livros de escritores amigos, muitos livros que me vão chegando a casa, umas vezes por oferta e outras por troca ou compra. Aproveito para dizer que por esta via tenho descoberto escritores com imenso talento, que, infelizmente, a maior parte das vezes não chegam sequer a ver os seus livros naquilo a que podemos chamar o “mercado do livro”.
Quero agradecer ao Miguel Almeida pela disponibilidade e atenção que dispensou para esta entrevista - a segunda do blogue.
«Ser Poeta» é um dos poemas inseridos no próximo livro do autor, e é composto assim:
Ser Poeta
Eu quero tudo,
A luz do Sol,
O brilho da lua,
E o manto das estrelas,
À noite, no seu lugar
A cintilar;
Eu quero tudo,
O verde viçoso das ervas,
As árvores despidas
E as folhas mortas,
Libertas, no ar
A esvoaçar.
Eu quero tudo,
A jovialidade dos anos,
Sem idade, o seu poder
Mais ao saber e à paz,
Dentro de mim,
A dominar.
Eu quero tudo,
Eu quero mesmo tudo,
Eu quero que a vida seja só,
Uma imensa Primavera, a passar
Porque esse é o querer do poeta,
Querer,
Querer só,
Apenas querer,
Querer, que em tudo
Haja agora só Primavera,
Uma Primavera, que se dá na vida
Com tudo sempre, apenas só, a desabrochar.
Miguel Almeida, “O Lugar das Coisas”, Esfera do Caos, 2012.
Antes de mais, agradeço ao Blogue Silêncios que Falam por me ter permitido dar esta entrevista. O pano de fundo da entrevista é "O Lugar das Coisas", o meu próximo livro de poesia, mas a verdade é que as respostas que dei vão muito além deste meu novo livro. O meu muito obrigado, Silêncios que Falam.
ResponderEliminarParabéns, Migueis: O Pestana, entrevistador e o Almeida, entrevistado.
ResponderEliminarAs maiores felicidades para o Miguel Almeida, nos seus dois novos livros e parabéns.
O professor Miguel Almeida é uma autor incrível, em tão pouco tempo publicou um sem-número de livros. Todavia, entre este sem-número, convém dizer que existe algo bastante peculiar, e transversal, em todos eles, a saber: a simplicidade do vocabulário é perceptível a qualquer pessoa, do miúdo ao graúdo, do indivíduo sem habilitações ao indivíduo com habilitações, e é algo extremamente extradordinário, pois a mensagem que dilata é amplamente transmitida a todos. É uma pessoa, autor e professor empenhado, é um homem tríplice que se esforça para equilibrar a sua vida pessoal, a profissional e a artística. parabéns!
ResponderEliminarO Miguel é um dos poucos poetas portugueses contemporâneos que eu admiro.
ResponderEliminarE uma pessoa a pensar que faz o que faz e ninguém vê... Como é natural, agradeço os comentários do Arnaldo, do Rúben e do Manuel. Por diferentes vias, todos vós têm tido acesso ao meu trabalho e apreciam-no e eu só tenho que vos estar muito grato por isso. Um Grande Abraço para cada um de vós.
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