«Encontro-me sensivelmente a meio do segundo volume. Já tem título, e espero acabá-lo até ao final deste ano.»
Ter
vencido a 1ª edição de um prémio literário português com O Espião Português, revelou-se a força motriz que faltava ao autor,
para ver publicado e «valorizado» o seu livro de estreia, depois da publicação deste
ter-lhe sido recusada por várias editoras – o que confirma o quão difícil é, para
um autor em Portugal, publicar um primeiro livro, independentemente da sua idade.
Excepções, ela as há, nomeadamente os casos de afilhadismo ou até os de sorte,
epítetos à parte.
O certo
é que o romance policial de Nuno Nepomuceno foi o escolhido de entre as, aproximadamente,
300 obras a concurso. Isto deixa-nos com duas opções: a qualidade das obras que
concorreram ao Prémio são muito más, ou O
Espião Português é um livro excepcional.
O
romance é um thriller intenso replecto
de suspense, intriga e contornos imprevisíveis, e que tem como panos de fundo
Lisboa, Estocolmo, Londres, Roma e Viena. É o primeiro volume duma trilogia que
promete surpreender os fãs de Literatura Policial.
O
autor nasceu nas Caldas da Rainha em 1978 e licenciou-se em Matemática pela
Universidade do Algarve. A par da escrita, Nuno Nepomuceno exerce a profissão de
controlador de tráfego aéreo.
Estando
tudo a postos, só falta conhecermos o piloto das respostas seguintes.
Texto: Miguel Pestana
Foto: Cedida gentilmente pelo autor
Foto: Cedida gentilmente pelo autor
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Escrever é uma paixão ou uma
vocação?
Por
enquanto, uma paixão. O Espião Português
é o meu primeiro livro e não ouso sequer falar noutros termos.
E ler, desde cedo teve esse hábito?
Sim, desde muito novo. Quando criança, ia com frequência à biblioteca, e trazia
para casa cerca de três livros por semana. Eram apenas estes, porque não me
deixavam alugar mais. Fui aquilo que se pode chamar de uma criança sossegada.
Brincava frequentemente sozinho e entretinha-me facilmente a ler. Poder viver
segundo o imaginário de outra pessoa, é algo que ainda hoje me fascina.
Consciente disso mesmo, a minha família também teve a preocupação de me
oferecer livros. Ainda tenho a colecção de Os
Cinco no meu antigo quarto, em casa
dos meus pais. Foi a minha irmã mais velha que me a deu.
Qual o livro que o marcou na sua
adolescência?
Não
consigo destacar um que me tenha marcado em particular, não no sentido de ter
mudado algo. Mas recordo-me com especial prazer de Os Três Mosqueteiros, do Alexandre Dumas. Li um dos volumes apenas
numa tarde, na praia.
Deduzo que o Nuno seja um grande leitor
de romances policiais?
Sim,
é o meu género preferido. Gosto bastante do que o Stieg Larsson fez com a
trilogia Millennium, mas também
admiro o trabalho de outros como a dupla Nicci French, Ken Follett, ou ainda
Craig Russell, cuja série do inspector Fabel considero subestimada.
Mas lê outros géneros literários?
Gosto
de variar um pouco, e tenho o hábito de não ler dois livros do mesmo género de
seguida. Vou intervalando a literatura policial com alguma fantasia e um ou
outro romance histórico. Acho um pouco limitativo estar sempre a ler a mesma
coisa, e às vezes, há grandes surpresas. Recordo-me em particular de O Ciclo da Herança, de Christopher
Paolini. Foi um familiar que me ofereceu o primeiro livro, e na altura nem
sequer o conhecia. Mas gostei imenso. Comprei o último no dia em que saiu, e
sem sequer ler a contracapa.
Quando enviou O Espião Português para a organização do Prémio Literário book.it,
sentiu alguma epifania de índole positiva ou manteve-se pouco expectante em
poder ser o vencedor?
Quando
concorri, já tinha decorrido um ano sobre o fim de O Espião Português. Estava a tentar encontrar uma editora onde o
livro pudesse ser valorizado, mas até então apenas tinha recebido recusas. E
era algo que me estava a deixar bastante frustrado, já que achava que tinha uma
história coerente e com personagens bem delineadas. Não entendia o porquê, mas
também não havia muito mais que pudesse fazer para o contrariar. Por isso,
preferi não criar demasiadas expectativas. Pareceu-me uma boa oportunidade, mas
resolvi não me entusiasmar em demasia. Pura e simplesmente, um livro melhor
poderia concorrer. E nesse caso, seria justo que o mesmo vencesse.
Qual foi a sua reacção quando soube
que tinha vencido o Prémio?
Foi no dia
1 de Agosto. Não estava em casa, mas sim a praticar desporto, e não vi a
chamada. Quando a devolvi, até pensei tratar-se do atendimento ao cliente de
uma empresa, contra a qual tinha apresentado uma reclamação, já que não
reconheci o número e só esperava saber o resultado do concurso em Setembro.
Falei com a responsável da book.it durante cerca de 20 minutos e depois
sentei-me num banco, nos balneários, e deixei-me ficar em silêncio, por entre
uma grande algazarra. Não contei nada a
ninguém durante três semanas. Por fim, disse aos meus pais e restante família
mais próxima. O prémio book.it é algo de que me orgulho, mas sempre mantive a
minha escrita privada e não sabia como a apresentar aos outros. Só contei aos
meus amigos cinco dias antes do lançamento. Perdi um dia ao telefone.
Desde o escrevinhar a primeira frase
até ao último ponto d’O Espião Português,
quanto tempo decorreu?
Seis anos,
com um interregno de quase três, motivado por questões pessoais e
profissionais.
Existem autores que iniciam a escrita de
um livro e não sabem o que acontecerá no final da história. Aconteceu isso com O
Espião Português?
Não.
Sempre soube como queria terminá-lo. Tal como os restantes dois volumes, aliás.
Se quisesse escrever hoje o fim da trilogia, fá-lo-ia sem qualquer hesitação.
Tenho esse capítulo completamente definido no meu imaginário.
Que pode o leitor encontrar neste
seu romance de estreia?
Trata-se
essencialmente de um romance de espionagem com os elementos clássicos do mesmo.
As intrigas, traições, perseguições, suspense, exotismo de algumas personagens,
e o trabalho em equipa, são ingredientes que foram propositadamente planeados.
Depois, tentei contrapor com outros elementos. Nomeadamente, os valores
tradicionais portugueses, como família, amizade, amor e confiança, bem como
algum humor. Embora só o leitor possa dizer se o consegui ou não.
Em que se baseou para «construir» o
personagem André Marques-Smith (Freelancer),
o protagonista do triller e, por conseguinte,
da trilogia?
Numa
primeira fase, tentei criar alguém que simbolizasse o que melhor tem o mundo
contemporâneo. O André, apesar de ser francamente português, é muito
cosmopolita. Nasceu fora do país, tem uma família multicultural, e viaja
frequentemente pela Europa, a trabalho. Depois, comecei a preocupar-me mais com
a dimensão psicológica da personagem. As relações que mantém com os pais, irmã,
amigos, e ex-namorada, são muito importantes para o desenrolar do livro. São
elas que caracterizam o protagonista e que, no fim, também o vão modificar.
São várias as capitais europeias
onde a acção e maior suspense da narrativa decorre. Teve algum intuito no
escolher dessas cidades?
Sim.
Queria escrever um livro com um ritmo contemporâneo e actual, mas ainda assim
com um ambiente clássico. O André defende valores bastante tradicionais, como
família e amizade. Por isso, achei que deveria movimentar-se em cenários mais
intemporais. Mas ele é também um homem dos nossos tempos. A operação final em
Viena de Áustria acaba por sintetizar tudo isto. Tanto o vemos num clube
nocturno vanguardista, como numa biblioteca cheia de simbolismo e história como
a nacional austríaca.
Muitas das frases do romance são
concisas, muitas vezes compostas por uma só palavra. O seu lema é transmitir
muito com pouco? Menos com menos é igual
a mais. É isso?
É
engraçado que refira isso, já que a editora é da mesma opinião. Mas quando
estava a escrever O Espião Português
adoptei esse estilo, mais com o intuito de fornecer maior rapidez à acção, o
que envolveu algum esforço, já que tenho tendência a escrever frases bastante
longas.
Tem algum autor preferido, que tenha
servido de fonte de inspiração para o livro?
O
Daniel Silva é o meu autor favorito e o que tenho como maior exemplo. Li todos
os seus livros publicados em português e admiro imenso o seu trabalho. O último
capítulo de O Espião Português, em
que assistimos ao ponto de vista de uma outra personagem sobre o protagonista
da história, é a minha pequena homenagem.
Já se encontra a escrever a
continuação d’O Espião Português,
certo?
Sim.
Apesar de tudo, acreditei sempre que o projecto tinha potencial para prosseguir
e não parei após o término do mesmo. Encontro-me sensivelmente a meio do
segundo volume. Já tem título, e espero acabá-lo até ao final deste ano. Como
tenho outra profissão, igualmente ou ainda mais exigente, não está a ser tarefa
fácil. Mas é nesse sentido que me encontro a trabalhar.
Que feedback
obteve dos leitores que se deslocaram às várias sessões de autógrafos
decorridas nas lojas book.it, durante a campanha promocional do livro?
Felizmente,
tem sido bastante positivo. A maior parte dos leitores que não me conhecem
pessoalmente, têm destacado o ritmo e emoção da história. Têm-me dito que não
conseguem parar de ler e têm-se mostrado bastante curiosos quanto à
continuação, o que é animador. Na loja da Maia, contaram-me o caso de um
cliente regular a quem foi sugerido O
Espião Português e que regressou à loja apenas para agradecer à
funcionária, porque de facto tinha gostado muito do livro. Como autor, não
posso imaginar maior elogio. Já entre os meus amigos, a reacção tem sido algo
mais singular. Há uns dias, disseram-me algo do género: “Quem diria, tu és tão
caladinho, e tens uma imaginação destas. Nem imagino o que não te atreves a
escrever”.
O
Espião Português
está à venda em qualquer livraria?
Não. Por
questões de regulamento do prémio, os pontos de venda da Sonae (grupo que detém
a book.it) têm o exclusivo. Neste momento, O
Espião Português só pode ser comprado nas livrarias book.it, e nas lojas
Continente e Worten. Só finda a vigência do prémio (Novembro de 2013), é que a
ASA o poderá distribuir livremente.
Qual o livro que está lendo? Pode
transcrever a primeira frase do livro?
O Leão de Oz, de Gregory Maguire (Casa das Letras).
«Chegou a
altura de ela morrer, e ela não morria; assim sendo, talvez definhasse,
pensaram, e definhou, mas não se extinguiu; chegou então a altura de receber a
derradeira absolvição, por isso colocaram-lhe velas na clavícula, mas ela não
consentiu tal coisa.»
É adepto de ler digitalmente ou
prefere sentir o tacto e cheiro dos livros?
Nunca li
uma edição digital, embora reconheça a necessidade ambiental e pertinência no
mundo actual. Mas para mim não há nada melhor que folhear um livro.
Costuma comprar livros online ou desloca-se às livrarias?
Regra
geral, vou eu próprio às livrarias. Embora esteja sempre a ler qualquer coisa,
não compro tudo, e assim estou a par do que vai
aparecendo. Apenas recorro à venda online
quando estou à procura de algo que não consigo encontrar, como livros mais
antigos de autores que descobri recentemente■
Site e página do Facebook do autor.
Nota: A entrevista foi realizada via e-mail.
Ao ler esta entrevista senti muita determinação por parte do autor. O titulo "Espião português" fascina-me e cativa-me muito.
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