Editora: Guerra e Paz
Data de publicação: 29/06/2016 N.º de páginas: 200 |
Antes de direcionar alguns parágrafos sobre os dois textos que estão coligidos neste primeiro volume de uma nova colecção da Guerra e Paz Editores, vou estender algumas palavras sobre o objecto em si que é este livro. Normalmente, escrevo na parte final das resenhas sobre a parte visual e gráfica dos livros, mas no caso desta obra vou inverter o habitual.O primeiro detalhe que este livro 15 por 20 centímetros pronuncia é a sua cor, que também encontra-se pintada (à mão) nas três faces do miolo – um verdadeiro regalo para a vista. A capa tem a particularidade de ter uma fenda elíptica que separa os títulos dos textos que nele se encontram. Não só por fora o livro é chamativo, desenganem-se. Exceptuando as páginas onde vem assentado os textos de Fernando Pessoa e Oscar Wilde, todas as outras cerca de 60 páginas, com notas biográficas dos autores e contextualização sobre ambos os títulos, da autoria do editor irreverente Manuel S. Fonseca (que afirma editar livros que ele próprio, enquanto leitor, gostaria de encontrar nas livrarias), têm uma parte gráfica estimulante aos sentidos: a paginação joga com as cores antípodas e contrastantes branco e preto, com os tamanhos das letras e palavras; um trabalho criativo do designer da editora, Ilídio J.B. Vasco, que já nos habituou a olhar com outros olhos as capas dos livros que a Guerra e Paz publica. Depois de sentir com a visão e com o tacto O Banqueiro Anarquista / A Alma do Homem sob a Égide do Socialismo, é o intelecto do leitor que será despoletado de seguida, assim que ele iniciar a leitura destes escritos com pendor político e filosófico. Um texto em prosa de Pessoa e um ensaio de Wilde. O primeiro, data de 1922, o segundo, de 1891.O Banqueiro Anarquista acompanha o diálogo tido entre dois velhos amigos, após terem jantado. O narrador é o interlocutor mais passivo da conversa, que questiona o amigo e o ouve atentamente, tentando perceber como e porque ele tornara-se anarquista e posteriormente banqueiro. Tal contradição é, paulatinamente, enquanto o diálogo decorre, fundamentada pelo anarquista que diz-se consciente e convicto, em comparação com «os parvos dos sindicatos», que «são anarquistas só na teoria; eu sou-o na teoria e na prática. Eles são anarquistas e estúpidos, eu anarquista e inteligente.» Todos devem trabalhar para o mesmo fim, mas separados, e a liberdade para todos só pode vir com a aniquilação das ficções sociais, podemos concluir deste texto em prosa de Fernando Pessoa, que permanece intemporal.António Rodrigues é o autor da mais recente tradução portuguesa de The Soul of Man under Socialism, o ensaio que ocupa 70 páginas e que encontramos na segunda parte deste livro. Quais os benefícios que os homens retirariam de uma sociedade regida pelo socialismo? Tendo por base alguns contextos da sociedade inglesa da época, Oscar Wilde mostra-nos o seu invencível desejo de se revelar contra todos os sistemas de ideais, e afirma que «o Socialismo será importante simplesmente porque levará ao Individualismo». A Alma do Homem sob a Égide do Socialismo está escrito num estilo incisivo e imbuído de ironia, o que é apanágio do autor irlandês, e além de abordar questões políticas, nos presenteia com a sua visão de como a Arte desempenha um papel fundamental num estado social. É neste ensaio que estão reunidas algumas das frases mais sagazes e conhecidas de Oscar Wilde, que amiúde lemos em posts nas redes sociais. São exemplos: «Viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas contenta-se em existir.» (p. 144) e «Qualquer um pode sentir compaixão pelos sofrimentos de um amigo, mas é preciso uma natureza mais fina – a natureza de um Individualista – para estar em comunhão com o êxito de um amigo.» (p. 191).Resumindo: O Banqueiro Anarquista / A Alma do Homem sob a Égide do Socialismo são exercícios mentais proveitosos, da autoria de dois génios que, coincidentemente, morreram no mesmo dia de Novembro (30).Mais informações sobre a colecção Livros Amarelos, clica aqui.
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