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sábado, 6 de abril de 2013

Último dia do Festival Literário da Madeira

As três ‘Conversas Cruzadas’ que marcaram o último dia do FLM tiveram como mote as artes da Guerra, da Religião e da Economia, e tiveram como ponto de partida os livros A arte da guerra, A arte da libertação, e A arte de pagar as suas dívidas, de Sun Tzu, Krishnamurti e Balzac, respectivamente.

Na primeira, falou-se sobre guerras de silêncios, de palavras («A verdadeira arte da guerra deveria ser travada com palavras, não com armas.» — proferiu o poeta João Luís Barreto Guimarães), de insultos, de ideologias; e sobre as consequências sociais e literárias que as guerras (literalmente) provocam nas pessoas, em particular nos escritores e suas obras. Falou-se de Homero e da sua Ilíada, inevitavelmente. O primeiro diálogo cessou com a declamação de poemas de e por João Luís Barreto Guimarães. Sublimes e muito propositados à temática da conversa.

Na segunda, a intervenção do padre Anselmo Borges veio clarificar algumas questões de atualidade religiosa, mais concretamente a relação entre o Homem e a Transcendência, e sobre «as pessoas que utilizam a religião para aprisionar muita gente.» A jornalista e escritora cubana Gina Picart, foi nesta mesa a que mais ovação despertou dos espectadores presentes no Teatro Baltazar Dias, muito devido ao conteúdo reinvidicativo da sua intervenção, sobre a religião entre culturas antípodas (Oriente-Ocidente). Uma outra voz, a de Tabish Khair, veio somar à conversa os dogmas e crenças indianos.

Na terceira e última ‘Conversa Cruzada’ os participantes intervenientes foram Carlos Quiroga, Maria do Rosário Pedreira, Raquel Varela, Rui Zink e Carlos Vaz Marques. Foi esta também, no que me toca, a sessão mais consistente, em ideologia, em cruzamento de pensamentos, em que o tema da conversa gerou interpretações múltiplas, em cada participante. Afinal o que é a dívida? Todas as intervenções foram brilhantes. Umas mais sentimentais (Carlos Quiroga), outras mais críticas, sobre a conjectura actual e histórica da política, e sem encandeamentos (Raquel Varela), outras mais pessoais e divertidas (Rui Zink, que até chegou a cantar…), mas aquela que mereceu toda a minha atenção e consideração foi a de Maria do Rosário Pedreira. A editora e poeta, no seu tom calmo, ligeiro, fez a intervenção que para mim marca este Festival. Dívida e Literatura. Dois temas que, a priori, pouco se conjugam, serviram de base para a autora construir uma história, mas não de ficção. Falou sobre o seu tempo de infância, da sorte que teve em crescer numa casa com livros, na sorte de ser do tempo em que os professores aconselhavam e emprestavam livros aos alunos, de ser da época em que a educação era mútua, entre professor-aluno, e lembrou-nos do seu início profissional no sector editorial: da época em que havia poucos mas bons livros, de literatura; de quando estes não moravam em supermercados, em lojas CTT; de quando os livros não precisavam de adornos (saquinhos com rendas, lacinhos, etc.) para serem chamativos; de quando para se ser escritor era imperativo saber escrever, e não ser famoso; de quando os editores só editavam livros com qualidade e não do que nos últimos anos se tem visto. Disse com a seriedade com que lhe estava marcada no rosto, enquanto lia o texto, que «endividou-se» no momento em que decidiu abraçar a sua profissão, para o bem e para o mal. Os aplausos que Maria do Rosário arrecadou no fim da sua intervenção foram merecidos.

Por fim, o FLM fechou as cortinas, em apoteose, após a interessantíssima participação de Zygmunt Bauman e José Rodrigues dos Santos.

Parabéns à organização desta 3ª edição do Festival Literário, o primeiro que se realiza sem a colaboração da Booktailors — Consultores Editoriais.

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