A Papisa Joana
(segundo o texto de Alfred Jarry)
de Emmanuel Rhoides
Tradução e apresentação: Aníbal Fernandes
Edição: Julho de 2014
Formato: 14,5x20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 192
Editora: Sistema Solar
Emmanuel Rhoides (1836-1904) tinha nascido nas Cíclades, já iam quarenta e um anos, e não eram alheios à sua erudição os privilégios de um filho de embaixador que vivera em Génova, estudara literatura, história e filosofia em Berlim, levara a sua curiosidade arqueológica ao Egipto e aos restos da civilização dos faraós: tudo evidências de um bom tempo mais tarde enegrecido com o desastre financeiro dos Rhoides, o suicídio de um irmão importante como sustentáculo da família arruinada, a sua demissão do lugar de director da Biblioteca Nacional da Grécia (por causa de panfletos políticos que incomodavam o poder de Atenas), aquela esclerose dos tímpanos que nenhum médico conseguiu travar antes da surdez. Em 1904 a morte levou-o em pobreza e nostalgia; e cortava-o, sexagenário, da Grécia terrena que ele tanto tinha querido amar. A Papisa Joana («romance histórico», como lhe chamou) continua a fazê-lo pai do melhor texto ficcionado até hoje escrito sobre o que parece supremo embaraço para uma regra central da religião de Roma e causa de uma das agitações que entretiveram os meios literários do século XIX. Acrescentou-lhe dois títulos, nenhum deles ficção (Parerga em 1885 e Ídolos em 1893), hoje nas penumbras da literatura grega embora reconhecidos como brilho forte da sua erudição.
A papisa [Joana], que no século XIX teria podido vir a exemplo para defesa dos direitos da mulher aos lugares «masculinos» que lhe estão vedados, só foi em Rhoides (ortodoxo ferido pelos cultos degradados e supersticiosos dos cristãos) um mergulho nas águas medievais onde as religiões do Cristo viveram os mais negros dias da sua história. Fê-lo com ironia e sedução verbal, arrastando até à luz uma das suas lendas ou realidades mais incómodas — o supremo ataque contra a exclusividade masculina defendida pela interpretação autoritária dos textos sagrados. E levou a termo uma cruzada de ironização de bulas e relíquias, de baixas formas de fé que existiam e persistem nos permissivos tiques da religião popular, as que se nomeiam com o pejorativo da palavra «crendices». Talvez com espanto do autor, a recuperação de uma «verdade histórica oculta pelo Vaticano», e através dela o exercício de «uma análise crítica do vinho religioso que na Idade Média os povos do Ocidente bebiam nas bulas dos taberneiros de hábito», acertou em cheio num escândalo. Espalhou-o na letra de muitos exemplares vendidos, fez exaltar ânimos, alvoroçar autoridades, e provou sobretudo que a papisa continuava incómoda e era a lenda menos lendária das religiões do Cristo. [Aníbal Fernandes]
O que é Poesia?
de Sousa Dias
Edição: Julho de 2014
Formato: 14,5X20,5 cm (brochado, com badanas)
Número de páginas: 80
Editora: Documenta
Poesia, função da linguagem e não do vivido — mas arte do silêncio e não da palavra — o paradoxo da criação poética: dizer o indizível — todo o poema diz a sua própria impotência, sendo este o seu incomparável poder — Ruy Belo e o bilinguismo formal da poesia — verdade poética e verdade lógica: o excesso de ser no ser ou o real para lá do real — o exemplo do lirismo: não há poesia subjectiva — o poema, linguagem fora de si: heterogénese da língua como pintura e como música — a questão da imagem poética: estatuto ontológico, e não literário, dessa imagem — não há metáforas na poesia, a poesia é anti-metáfora — Herberto Helder e Manuel António Pina como exemplos da não-metaforicidade da poesia — porque é que raros autores que publicam poemas podem considerar-se poetas.
«Um poema é sempre mais do que um poema: é uma poética, uma ideia de arte poética. Cada poema é já um conceito do poético, já uma resposta à questão: o que é a poesia? Não há como os poetas para nos dizer o que poesia quer dizer, mas é nos próprios poemas —na noção implícita de poema, ou eventualmente explícita em termos ainda assim (meta)poéticos —que se encontra o pensamento «estético» dos poetas. É com efeito frequente os poemas de um poeta serem tudo o que ele pensa, tudo o que ele escreve, «sobre» poesia. «Pergunto como se escreve o poema? E a resposta possível / é escrever o poema» (Nuno Júdice, O estado dos campos). Sucede no entanto um grande poeta escrever textos de teoria ou de crítica literária que de certo modo fazem parte da sua obra poética, na medida em que constituem a auto-expressão teórica dessa obra, ou a sua passagem para um plano de doutrina estética. É o caso entre nós, de todos o mais conhecido, de Fernando Pessoa. Mas é também o caso, por exemplo, de Ruy Belo.» [Sousa Dias]
Sousa Dias nasceu no Porto em 1956. Professor. Publicou, entre outros livros, Lógica do acontecimento — introdução à filosofia de Deleuze, Questão de estilo (colectânea de textos de teoria da literatura e da arte) e Grandeza de Marx — por uma política do impossível. Tem no prelo Žižek, Marx & Beckett — e a democracia por vir.
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