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quinta-feira, 18 de setembro de 2014

«Confissão», de Tolstoi

Editora: Alêtheia
Data Publicação: Agosto 2014
N.º de Páginas: 140

Numa carta endereçada a Mahatma Ghandi datada de 7 de Setembro de 1910, Tolstoi, pressentindo o seu fim iminente, escreve: «À medida que envelheço e agora que sinto tão claramente a aproximação da morte, desejo contar aos demais as coisas que me comovem especialmente.» Inconformado com a vida repleta de conforto e riqueza, o autor russo com 82 anos, decide fugir de casa, para continuar a viver uma vida simples. No dia da sua fuga Tolstoi deixa uma carta à sua fiel esposa, a 28 de Outubro desse ano da sua morte (ele morre a 20 de Novembro), onde diz que a sua convivência em casa tornara-se insuportável, e que era sua intenção «ficar longe da vida mundana e viver em paz e em reclusão nos últimos dias de minha existência.»
A fase final — por muitos denominada como a de “conversão” — da vida deste que foi um dos escritores mais marcantes da literatura russa do século XIX, ficou marcada por uma grande crise espiritual. Uma «doença fatal interior» afectou o modo de pensar e de ver o mundo de um homem que, quase a completar cinquenta anos [em 1877, altura em que confessa ter tido um como que "momento de despertar"], era mundialmente reconhecido, tinha construído uma família, tinha riqueza e era respeitado e louvado por estranhos. A priori a felicidade era aquilo, mas porque tinha ele de lutar com o suicídio de tempos em tempos? Com a dita «doença fatal interior» a não dar paz ao homem que desde os dezasseis anos deixara de ir à igreja, tudo ia-se agravando. A crise existencial ganhara um aliado: a sua falta de fé. Em busca de um sentido para a vida Tolstoi relembra o seu passado, onde cometera assassínio (na guerra), mentiras, roubos, «promiscuidade de todos os tipos», etc. Ao dar-se conta de que não havia crime que não tivera cometido antes, e ainda assim era louvado, o autor de O Que é a Arte? encalça numa busca constante de respostas para as suas inquietações (contactando sábios indianos, monges, etc. e confrontando as ideias de filósofos como Sócrates e Shopenhauer). Para atingir uma vida mais feliz e com maior significado o autor deixou-se ficar mais próximo dos seus súbditos e quis captar o sentido que essas pessoas simples e trabalhadoras davam às suas existências. «O propósito do homem na vida é salvar a sua alma», chega a concluir.
‘Um Homem em Busca de um Sentido’ podia ser um outro título para Confissão, obra de cariz autobiográfico, escrita em 1882 e apenas publicada na Rússia em 1906, devido à censura eclesiástica. Esta obra escrita na primeira pessoa move-se em várias direcções, mas todas elas convergem num todo. Na extensão destas páginas o leitor segue lado a lado com o autor e consegue sentir toda a sua angústia de viver, sem saber qual nem para que sentido. Este é um livro que potencia a reflexão e que depois de lido, inquieta.
Quatro anos depois de terminar este livro Tolstoi escreveu A Morte de Ivan Ilitch, uma obra que tem como protagonista um homem que também procura de um sentido para o pouco tempo que tem de vida.
No que se refere à edição da obra propriamente dita, a cargo da Alêtheia, editora que tem vindo a publicar obras intemporais da literatura, há que deixar uma nota de advertência. Vários erros de (falta de ou de má) revisão e de morfologia, para uma obra de 140 páginas não passam despercebidos. São várias as gralhas que se podem anotar numa errata. Uma obra destas merece maior cuidado.


Excerto
«as pessoas muitas vezes preferem a escuridão à luz, porque as suas acções são más. Pois aquele que age maliciosamente odeia a luz e evita-a para que não ilumine os seus actos. Compreendi que a fim de entender a vida é primeiro necessário que a vida não seja má e desprovida de sentido.» (p. 110)

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