quarta-feira, 27 de outubro de 2021

«Maurice», de E. M. Forster

Editora: ASA
Data de publicação: Agosto de 2021
N.º de páginas: 240

Edward Morgan Forster (1879-1970) foi um escritor britânico que escreveu romances, contos, ensaios, peças de teatro, guiões para cinema e biografias. O seu único livro publicado postumamente, um ano após a sua morte, intitula-se Maurice. Esta obra, escrita entre 1912 e 1913, permaneceu na gaveta durante várias décadas, por vontade do autor, que nunca ousou publicá-la por causa da sua temática homossexual.
Há muitos anos esgotado na rede livreira portuguesa, esta obra semi-biográfica ganha uma novíssima tradução, assinada por Elsa T. S. Vieira.
Em Inglaterra, na década de 1910, dois jovens estudantes na Universidade de Cambridge tornam-se amigos. Maurice Hall é atraente, robusto, alegre, orgulhoso, ligeiramente hostil e com poucos dotes intelectuais. Clive Durham é inteligente, exigente, pragmático e de índole mais tranquila. O primeiro é da classe média; o segundo pertence à classe alta. Após serem absorvidos pela amizade, eles se apaixonam, de forma inocente e devastadora. Contudo, evitam confessar a natureza dos seus sentimentos, uma vez que nessa época a homossexualidade, além de socialmente condenada, ainda era considerada crime (ainda estava muito presente na lembrança dos ingleses, o encarceramento de Oscar Wilde por seus “actos imorais”).
Maurice é corretor numa firma em que é sócio; Clive exerce advogacia e política. Com o passar do tempo, Hall torna-se um homem amargurado, vivendo infeliz, incompreendido e cada vez mais sozinho («despertara tarde demais para ser feliz»), enquanto que Durham, após uma viagem solitária à Grécia, chega a Londres com uma atitude racionalista e negacionista em relação à sua relação amorosa.
Enquanto que um decide tentar “curar-se”, indo a um hipnotista, «Sou assim desde que me lembro, sem saber porquê. O que é isto afinal? Estou doente? Se estou, quero curar-me, não aguento mais a solidão», o outro dispõe-se, para seu castigo, viver infeliz, para agradar as convenções da sociedade de então; «Seria possível que a sociedade, enquanto se arvorava tão moral e sensível, na realidade não quisesse saber de nada?»
Maurice é um romance sobre uma lenta auto-descoberta e aceitação da sexualidade e a alegria de escapar (ou ficar preso) de uma sociedade confinada. Classe e sexualidade estão implicitamente ligadas ao longo de todo o romance, que tem também duras críticas às atitudes, leis e visões inglesas sobre o amor homossexual.
Mais de um século após a sua escrita, Maurice permanece mais intemporal do que nunca. Este clássico da literatura gay foi adaptado a filme em 1987 pelo realizador James Ivory (que em 2017 assinou o guião do filme Chama-me Pelo Teu Nome). O filme contou com interpretações de James Wilby e Hugh Grant, mas, como a maioria dos filmes inspirados em livros, é menos impactante.
Salientar que a LeYa reeditou recentemente outro clássico de literatura gay, que também como Maurice tem passado muito despercebido: A Biblioteca da Piscina, de Alan Hollinghurst.

Excerto
«Quando o amor desaparece, já não é recordado como amor, mas como algo diferente. Abençoados os ignorantes, que o conseguem esquecer completamente e não têm consciência das loucuras e lascívias do passado, das longas conversas fúteis.»

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