quinta-feira, 1 de novembro de 2012

«O Fotógrafo da Madeira», de António Breda Carvalho

Ano de Publicação: 2012
Nº de Páginas: 290

O presente romance de António Breda Carvalho, galardoado com o Prémio Literário João Gaspar Simões/2010, data a ilha da Madeira em finais da primeira metade do séc. XIX.
Feito homem em terras francesas, o advogado de origem madeirense e notável presença da sociedade parisiense, Afonso Elias Ayres Drumond, recebe uma carta, dando-lhe a notícia da morte de Leonor Ayres, sua mãe, e de que a produção do Vinho Madeira estava em vias de se estagnar. Afonso que não imaginara mais retornar à ilha que, por motivos políticos, forçou o seu pai a envia-lo sozinho, com doze anos, para terras livres de poder absolutista, toma uma atitude.
Agora, sem a matriarca da Quinta da Colina e única gestora da produção vinícola, Afonso toma a decisão de se mudar definitivamente para a sua terra e levar a cabo o testemunho familiar da produção do vinho licoroso de aromas envolventes. Para além deste objectivo, Afonso tenciona exercer advocacia em paralelo com o cargo de cônsul francês.
A 23 de Janeiro de 1846, o protagonista da história, agora com 34 anos, tem um desembarque atribulado, devido ao temporal que assolava a ilha: «Em muitas ruas da cidade os barcos navegavam para a custo salvarem muitas famílias (…). Por toda a parte se ouviam gritos de terror. Uma grande parte da cidade ficou destruída, e as casas, arruinadas (…).» (p. 63)
O retrato da tragédia foi tirado pelo daguerreótipo do madeirense, que é um amante da fotografia e da pintura. Dias passados, Afonso reestabeleceu contacto com três dos seus amigos de infância quando percorria as ruas e lugares do seu Funchal, e inteirou-se dos dogmas políticos e religiosos da região. A primeira imagem que formou da ilha era que esta era um retrato de duas cores. Por um lado, os turistas cada vez mais escolhiam a Madeira como destino de lazer e terapêutico, e em oposição, a miséria – não só a que se encontra nas ruas, também a de índole social (a mentalidade da maioria das pessoas era adversa à mudança) – e a emigração acentuadas.
Com a colaboração de Laura, a filha do feitor, Afonso elabora um plano para dinamizar o turismo, criando novos atrativos (fotografias com imagens da ilha, do bordado e vinho Madeira) para serem divulgados em vários países. Com o sucesso adensam-se inimizades e o culminar das adendas consome-se quando o cônsul se vê entre duas fações proselitistas.
A par do entrecho, o autor espelha suspense e sedução na relacção entre Afonso e Laura, entrelaçando-a com os flirts do advogado com Sophie e Claire: «Sentiu a ponta da língua dela embebida em néctar passear-se nos seus lábios, leve, levemente, como abelha bailando na ponta de uma flor.» (p. 119)
Assim é O Fotógrafo da Madeira, constituído por uma cuidada sintaxe, um rico léxico e, uma perícia e agilidade narrativa (um exemplo: «O aroma a café enrolava-se nas espirais de fumo saídas dos cigarros, cigarrilhas e charutos, a música alegrava os corações aquecidos pelo vinho, e esta sinestesia de sabores, cheiros e sons tornava o ambiente impregnado de emoções felizes, como se o tempo ali tivesse sido suspenso pela mão de um deus oculto.» (p. 90)) que António Breda Carvalho consegue captar e ilustrar, como se de uma fotografia fosse, uma época ricamente histórica da Madeira, através da descrição da sua etnografia (que denota-se bastante trabalho de pesquisa do autor), o que valoriza e torna estimulante esta leitura.
Um ponto fraco que aponto neste romance tem que ver com a excessiva enumeração de ruas do Funchal, nos primeiros capítulos. O epílogo poderia ser trabalhado com mais ênfase, contudo, a obra tem a mais-valia de prender o leitor nos primeiros capítulos (os mais ricos da narrativa).
Um livro que junta ficção e História. O resultado é uma profunda abordagem sobre a Madeira dos inícios de Oitocentos.
De António Breda Carvalho, um não-madeirense que em 1994 venceu o Prémio Literário Horácio Bento de Gouveia, é de se lhe tirar o chapéu, por ter escolhido a Madeira como eixo à volta do qual o seu romance se desenrola.
Nota: 4,5 de 5.
(Versão ampliada do texto publicado na edição de Novembro da revista Madeira Digital.)

11 comentários:

Unknown disse...

Já estive com esse livro mão. Pela nota dada, parece valer bem a pena.

Maria disse...

Tenho bastante curiosidade sobre este livro. Gostei muito da opinião!
Um livro a ler num futuro próximo!

Marisa Luna disse...

Gostava muito de ler este livro!
Um abraço

AndreiaS disse...

O livro deve ser fabuloso ;)
Bjinhos

Isa bel caldeira disse...

Um livro que gostaria muito de ler. Gostei muito da tua opinião.

Rita Domingos disse...

Tenho este aqui em casa para ler! :)

Unknown disse...

Um livro simplesmente encantador, um bom investimento e uma boa ideia para prenda de Natal ;)

Carina B. disse...

fiquei super curiosa :)

João Mira disse...

Deu vontade de ler

Tiago M. Franco disse...

Já acabei de ler o livro.
Confesso que quando o comprei tinha poucas expetativas relativamente à qualidade da obra. Nunca tinha ouvido falar do autor, além disso comprei o livro por causa da oferta que tinha.(Rio das Flores de Miguel Sousa Tavares)
Gostei, o livro tem uma coisa boa: a qualidade da obra vai-se revelando com o desenrolar da história e alcança o seu máximo no fim. Por vezes existem livros que prometem muito no início mas depois morrem, aqui foi o contrário. Recomendo.

Miguel Pestana disse...

É verdade Tiago, o início deste livro é muito forte, embora não ache que o "clímax" desta obra esteja na parte final.