quinta-feira, 23 de maio de 2013

«A Herdade», de Jane Smiley

Editora: Civilização
Ano de Publicação: 2013
Nº de Páginas: 448
Jane Smiley escolheu como cenário do romance A Herdade, uma aldeia provinciana de Iowa, E.U.A., com poucos habitantes, mas com muitos hectares de terra de cultivo. Os três fazendeiros mais influentes de Zebulon County são descendentes das famílias Cook, Clark e os Carson. Entre os patriarcas destas famílias sempre existiu uma cordialidade mascarada de inveja e ressentimento. «Numa herdade, manter as aparências é a principal preocupação… O que a sua herdade parece reduz-se a questões de carácter.» — é-nos contado na página 249, por Ginny, a filha de Larry Cook, e a narradora deste livro.
O regresso de Jess Clark à cidade, após dez anos no serviço militar, é a par da cena da tempestade, o momento mais marcante da história, pois é na festa de boas-vindas do jovem à sua terra, que o dono da maior herdade de Iowa, o orgulhoso e destemido sexagenário Larry Cook, anuncia publicamente que se irá reformar e deixar todas as suas propriedades agrícolas e residenciais para governo das suas três filhas: Ginny, Rose e Caroline. Os familiares e toda a vizinhança ficam surpreendidos com a declaração, pois Larry sempre foi conhecido por ser avarento. Caroline, advogada, a filha mais nova do fazendeiro, diz não querer essa herança, pois prefere viver longe da sua família, tal como acontece desde que ela foi enviada para um internato, e posteriormente frequentado a universidade. Caroline é a personagem mais misteriosa nesta história, visto que muda de atitudes muito constantemente. Se no início do romance ela é-nos descrita como uma irmã e filha ausente, no desenrolar da trama a advogada troca de lugar com o resto das personagens: passa ela a ser a pessoa mais protegida do seu pai.
A partir deste ponto da história a luta pelo poder tem início, e com ela a revelação da verdadeira personalidade de todos os membros da família, que até agora evitavam o contacto. Falar deixou de ser importante desde que a mulher de Larry morreu, ainda as filhas eram crianças. Ódios, amnésias, incestos que deixaram feridas na alma, no corpo, emergem, resultando rapidamente em psicoses, tragédias, mortes. «(…) ele abusou de nós e batia-nos. Batia-nos mais do que abusava de nós. Batia-nos por rotina… o facto é que todos eles aceitam que bater é um modo de vida…», revela-nos Ginny, na página 373.
Ao mesmo tempo que a industrialização instala-se, paulatinamente, em Iowa, os mais velhos continuam a manter as suas atitudes, crenças, processos à moda tradicional. Com a inevitável mudança, sinal dos tempos, o ânimo para trabalhar e manter as terras e herdades na perfeita aparência, custa cada vez mais. O enredo centra-se também sobre o casamento conturbado de Ginny, nas suas dificuldades em ter um filho e num seu relacionamento extra-conjugal.
A Herdade retrata a natureza humana de uma forma excepcional. A palavra herdade tem vários significados: herdade de casa, herdade de herança, herdade de hereditariedade. «(…) cada pessoa que desapareceu me deixou alguma coisa (…) eu sinto a minha herança quando me recordo de uma delas.» (p. 454)
A obra que teve a sua primeira edição em 1991, é um romance urdido com mestria pela autora de Vida Privada (publicado também pela Civilização). Jane Smiley é uma exímia contadora de histórias e talvez por possuir esse tributo venceu, com este romance, o tão prestigiado Prémio Pulitzer, em 1992, e viu o romance adaptado para filme, A Thousand Acres, em 1997, que contou com a participação da actriz Michelle Pfeiffer.

5 comentários:

redonda disse...

Vi o filme e gostei das interpretações (a história era triste, mas pelo que me lembro gostei também de aproximação no final entre as irmãs)

Miguel Pestana disse...

Estou com curiosidade para ver o filme. Espero que haja em DVD.

AndreiaS disse...

A capa é linda!

AndreiaS disse...

Tem na minha biblioteca, a ver se o leio ainda este ano!

BKloimp disse...

A sinopse intrigou-me e instigou-me a lê-lo. É pela voz de Ginny que vamos tomando conhecimento do enredo e a história da sua família vai-nos sendo apresentada. Gostamos de imediato desta personagem. Íntegra, recta. Já do seu pai não podemos dizer o mesmo... E, bem devagar, tomamos conhecimento dos segredos que os envolvem, das coisa que ficam por dizer, dos sentimentos mais profundos que envolvem esta família. E de repente a revolta da personagem principal é tal, face aos segredos que descobre, que o seu comportamento interior sofre uma mudança tão profunda e radical que somos surpreendidos pelos seus actos de uma grande crueza. Mas a nossa empatia perante esta personagem mantem-se porque ela já nos conquistou definitivamente!

Um bom livro.
Recomendo