Árvore Anciã – Contos, de Ricardo Barros
Uma árvore, anciã como as nervuras do tempo, cresce no cerne deste livro. Os contos, veios de um tronco enrugado, urdem memórias e identidades entre o que se diz e o que se perde no rumor das raízes. O autor escreve como quem rasga a pele do mundo: a pena arde, febril, entre lirismo e crueza; devassa segredos no lume incerto da memória e varre a fuligem do passado – a nostalgia de infâncias perdidas, ecos da guerra colonial que colidem com a dureza da cidade, rostos de família que persistem na bruma dos dias.
As palavras ora correm como um rio sereno, ora se partem como um osso exposto entre carne e metáfora – fluxo incandescente, sulco na madeira, cicatriz no tempo. Árvore Anciã não é um livro: é um corpo pulsante, trespassado pelo lume e pela voragem. Quem o lê não o lê – entra nele, perde-se, torna-se a própria travessia.
A Multiplicação dos Milagres, de João Pedro Porto
Berto Brizi é a Osga, um editor turinense radicado em Milão que, à falta de bons autores, e confinado a uma vida de hedonismo, hipocondria e muita preguiça, inventa três génios literários. Um dia, batem-lhe à porta os três, encarnados, sanguíneos de paixões e ódios. Que fará Brizi? Denunciar os farsantes será denunciar a sua farsa e, assim, perder os seus confortos.
A sua caprichada mentira poderá agora ser uma verdade da qual não consegue escapar. Uma viagem por Itália, sem que essa palavra seja uma vez escrita ou lida, desde uma aldeia fantasmagórica piemontesa até ao grande vulcão do sul, enchendo olhos e estômagos com inexpugnáveis iguarias, antigas fábulas de máquinas, figuras e criaturas míticas, esta é uma carta de amor ao país de Dante, e um elogio ao lugar da ficção no mundo.
Uma história atemporal que denuncia os nossos dias de verdades incertas. Um romance ao estilo de Italo Calvino, com o sentido cénico de Pirandello, mas numa voz distinta, que testará o leitor mais pronto à verdadeira aventura literária.
Quando o desejo sabe a mar, de Carlos Enes
Dizes bem: o desejo sabe a mar. Incorpora a imensidão, a frescura, o inesperado, a inconstância e a pitada de sal que tempera o desassossego das nossas almas. Se eu fosse o Criador transformava todos os dias da semana em quintas-feiras. Os dias do nosso amor. Amor apressado, clandestino, amor esplendoroso e louco. Dou a vida para estar contigo, pois cada minuto é um minuto de ouro, como bem afirmas.
Sinto-me terra por lavrar, aguardando a cada instante o orvalho da madrugada, o arado que me revolve em ondas de prazer infinito. Adoraria que as noites fossem passadas ao teu lado e não aqui por cima de ti. Nem imaginas o que sofro, ao saber que há apenas um soalho a separar-nos. Quando o silêncio é mesmo silêncio, ouço os teus passos e, se apurar bem o ouvido, até agarro a tua respiração. Como poderei dormir nestas condições?
Não sei que forças invisíveis me impedem de saltar da cama, descer a escada e entrar nos teus lençóis. E depois de saciar a fome, pedir que cantes baixinho, em serenata doce junto do ouvido: Amapola, belíssima Amapola…
segunda-feira, 24 de novembro de 2025
Livro de contos «Árvore Anciã» entre as novidades das Edições Letras Lavadas
publicado por Miguel Pestana
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